“Entrámos num ciclo de obra para as pessoas e para as famílias”

Hélder Sousa Silva falou da renovação em Mafra. - ph. José Guerra

 

Texto: Hugo Rocha Pereira | Fotografia: José Guerra

 

As eleições realizadas no passado domingo trouxeram muitas caras novas ao mapa autárquico nacional, em boa medida graças à Lei de Limitação de Mandatos. O Concelho de Mafra é um dos casos de renovação, não de cor política mas de equipas, ideias e propostas. Com a saída de Ministro dos Santos (que, estando no poder há 28 anos, não se pôde recandidatar), entra em cena Hélder Sousa Silva, também do Partido Social Democrata. Encontrámo-nos na esplanada do restaurante Sul, no Parque de Santa Marta, para uma conversa antes da tomada de posse como novo Presidente da Câmara Municipal de Mafra, que ocorrerá em meados do mês que agora começa. Nesta primeira parte da entrevista temos, precisamente, como foco principal a renovação, seja de pessoas e políticas como de modelos de desenvolvimento, que devem ser repensados em tempos de crise financeira.

 

Renovação

Como pensa concretizar a renovação que foi um dos motes da sua candidatura?

A renovação passa pela mudança de equipas e projectos. Aquilo que o PSD propôs em termos de listas para a Câmara, Assembleia Municipal e Juntas de Freguesia foi equipas completamente renovadas. A Câmara não tem um único elemento da actual equipa que transite para a equipa futura. O mesmo acontece na Assembleia Municipal e, das onze Freguesias, o único presidente que se mantém é o presidente de Mafra. É evidente que a questão da renovação não tem a ver, exclusivamente, com a inclusão de gente jovem. Há gente de todas as faixas etárias, mas o que nos interessa é a capacidade e a competência de cada uma das pessoas que integram a equipa e que vão renovar aquilo que tem sido o trabalho desenvolvido pelo PSD ao longo destes últimos trinta anos no concelho. Esta renovação, naturalmente, também corresponde aos anseios daquilo que foi a auscultação das bases dos nossos eleitores.

 

A Câmara não tem um único elemento da actual equipa que transite para a equipa futura.

 

Ou seja, será também uma renovação de ideias e de políticas?

Exacto. É evidente que tudo tem um ciclo e o PSD passou por um ciclo de obra em termos infraestruturais. Agora entrámos num ciclo de obra para as pessoas e para as famílias e é nessa perspectiva que a renovação também acontece. O nosso foco nos próximos quatro anos, direi mesmo até na próxima década, não vai ser mais a questão infraestrutural. Já temos auto-estrada, escolas, parques desportivos, praias fantásticas… O que queremos é consolidar a qualidade de vida para as pessoas e aquilo que liga directamente às famílias: a questão do bem-estar social, que hoje em dia, infelizmente, a nível nacional, carece de um cuidado especial. Portanto, os próximos anos vão ser muito virados para as famílias do nosso concelho.

 

Existia um grande anseio por parte dos habitantes da Ericeira em terem uma auto-estrada de ligação rápida à capital. A Ericeira, com isso, ganhou uma centralidade que não tinha.

 

Hélder Santos Silva. - ph. José Guerra

Hélder Sousa Silva. – ph. José Guerra

Referiu no jantar de apresentação da sua candidatura que Mafra não necessita de investimentos megalómanos. Considera que obras como a A21 ou as obras de requalificação do Convento de Mafra, aqui do parque de Santa Marta ou de Ribeira d’Ilhas foram investimentos megalómanos?

Considero todos os casos de que me falou, e ainda outros como o parque escolar, de extrema importância que em nada têm ligação com megalomania, correspondendo essencialmente àquilo que eram à data os anseios e as aspirações dos nossos concidadãos. Relembro o caso da A21, especialmente o troço que ligou Mafra à Ericeira. Existia um grande anseio por parte dos habitantes da Ericeira em terem uma auto-estrada de ligação rápida à capital. A Ericeira, com isso, ganhou uma centralidade que não tinha. Não é também indiferente à questão da auto-estrada o número de turistas e de habitantes que a Ericeira passou a ter, porque muitos dos actuais habitantes, que eram antigos veraneantes, passaram a encontrar na Ericeira o seu local normal de habitação. Portanto, esta foi uma obra de relevância enorme, e ainda bem que alguém teve a ousadia de a pensar e, diria também, o atrevimento de a construir.

 

Nos meus dois últimos anos de mandato, contribuí para que a construção fosse sujeita a um travão no nosso concelho, porque já estávamos a atingir limites de alguma saturação.

 

Desenvolvimento do Concelho

O seu antecessor, Ministro dos Santos, afirmou que a herança que deixa é pesada. A Câmara de Mafra está com saúde financeira para enfrentar a presente crise?

De facto, uma das minhas preocupações prende-se com a responsabilidade financeira da Câmara, o compromisso e o serviço da dívida para os próximos anos. Assumo que é uma grande preocupação, porque aquilo que têm sido as receitas da Câmara – muitas delas ligadas à questão do imobiliário –, felizmente acabaram. E digo felizmente porque penso que a construção que existe no concelho chega perfeitamente para a procura que vai existir na próxima década. Eu próprio, nos meus dois últimos anos de mandato, contribuí para que a construção fosse sujeita a um travão no nosso concelho, porque já estávamos a atingir limites de alguma saturação. Não havendo construção, e sendo a construção até há bem pouco tempo um dos pilares financeiros, é natural que a Câmara vá ter muitas dificuldades nos próximos anos. Ao candidatar-me, sei que isso vai ser uma realidade, mas as dificuldades também ajudam a motivar o engenho. E, sendo um engenheiro de formação, socorrendo-me desse chavão que é “a necessidade aguça o engenho”, penso que esta equipa irá conseguir ultrapassar essas dificuldades. Teremos de reequacionar as despesas de funcionamento e de investimento da Câmara. Portanto, isso vai ser um exercício que vai ter de acontecer, e esperamos que os nossos concidadãos possam entender a engenharia financeira que vai ter de nos acompanhar nos próximos anos.

 

Neste momento o eixo Ericeira–Mafra–Malveira–Venda do Pinheiro é essencialmente urbano, com características de população e de hábitos de vivência muito mais exigentes.

 

O Concelho de Mafra e a Ericeira tiveram um enorme crescimento urbanístico nos últimos anos – Mafra foi mesmo o concelho da Área Metropolitana de Lisboa que mais cresceu percentualmente em população e alojamentos entre os últimos Censos. Isto trouxe alguns problemas (nomeadamente em termos de paisagem) mas também bombeou muito sangue-novo. Como encara esta dualidade entre desafio e oportunidade?

Eu nasci e cresci em Mafra, saí de Mafra com vinte anos e regressei a Mafra aos 40. Quando cresci em Mafra, o concelho era essencialmente rural, o essencial de Mafra era a questão da tipicidade que vinha da sua ruralidade. Hoje a situação é completamente diferente. Como disse, na última década Mafra cresceu mais de 40%, foi o município do continente que mais cresceu, e isso levou a que a tipologia dos habitantes de Mafra tenha mudado completamente. Neste momento o eixo Ericeira–Mafra–Malveira–Venda do Pinheiro é essencialmente urbano, com características de população e de hábitos de vivência muito mais exigentes, fruto também daqueles que se mudaram para Mafra. Isto leva a que o nível de exigência tenha aumentado, o que acarreta uma obrigação adicional para os novos executivos. As necessidades da população evoluíram, ainda que a ruralidade continue a existir no interior do concelho.

 

E como pensa balancear a ruralidade e os novos núcleos urbanos do concelho?

Temos no nosso programa respostas para esses novos habitantes. Refiro-me à questão cultural, por exemplo. Neste momento, quer Mafra, quer a própria Ericeira, têm potencialidades que têm de ser muito mais desenvolvidas. Diria que no conjunto do Palácio, Tapada, Convento e Basílica começa a esboçar-se uma resposta a esta nova solicitação, mas a autarquia terá de ser ao mesmo tempo facilitadora e promotora da actividade cultural que corresponde à procura dos nossos novos habitantes. Por outro lado, estes novos habitantes também têm muito interesse pelas actividades desportivas e outdoor. Temos registado o aumento do número de praticantes de modalidades desportivas nos nossos pavilhões e parques desportivos, assim como na área do associativismo. E se formos ver quem são os elementos que as constituem, são essencialmente elementos que vieram viver para o nosso concelho recentemente.

 

Está, de facto, na hora de o Concelho de Mafra dar um salto em termos culturais… Não é que faltem equipamentos, mas são pouco utilizados…

Sim, esses espaços podem vir a ser mais dinamizados, seja pela Câmara, seja através de protocolos com as juntas de freguesia ou mesmo com as várias federações desportivas, de forma a facilitar o acesso e utilização de infraestruturas que, de alguma forma, não estão a ser potenciadas e poderão ser fruídas de forma diferente pelos nossos munícipes.

O mesmo partido, um olhar diferente. - ph. José Guerra

O mesmo partido, um olhar diferente. – ph. José Guerra

Leia a segunda parte da entrevista aqui.