Memórias do Bodyboard Jagoz: Pedro Pinto

 

Fotografia: DR

 

Impressão digital

Pedro Manuel Gonçalves Palhares Pinto

Nascido em 1967 em Lisboa

Guia Intérprete

 

Quando é que começaste a surfar?

Eu comecei a surfar na Ericeira, na praia do Sul, no Verão de 79 ou 80. Os meus amigos Brantuas, o João e o Pedro de San Diego na Califórnia, vieram passar cá o Verão e emprestaram-me um bodyboard da Morey Boogie e eu fiquei com ele um ano inteiro. Eu passei de colchão repimpa para uma prancha de esferovite e depois para um bodyboard. Em 1982, com 15 anos, fui passar o Verão à Califórnia com os nossos amigos Brantuas e o Zé Costa, vizinho dos Brantuas na Ericeira. Aí fiz bodyboard em vários spots e comecei a aprender, porque eu não sabia nada. Não havia informação nenhuma. Na Califórnia, em 1980, comprei a minha primeira prancha.

 ninguém fazia bodyboard, todos os meus amigos estavam a começar no surf

Quantas pessoas faziam bodyboard pela Ericeira quando começaste a apanhar ondas por cá?

Não havia ninguém, ninguém fazia bodyboard, todos os meus amigos estavam a começar a fazer surf: o Álvaro, Molas, Luís Azambuja, Luís Reis, Fozi, Jorge Cardoso, Miguel Palma. Não me lembro quando é que o Miguel Barata começou a fazer bodyboard, ele foi o segundo, se não estou errado um ou dois verões a seguir.

Em que picos ou praias costumavam surfar mais?

No princípio fazíamos mais na praia do Sul e depois começámos a aventurar-nos um pouco mais – quando havia poucas ondas íamos para sul: Lizandro e São Julião. Quando havia mais ondas para Norte Pedra Branca, Reef, Ribeira d’Ilhas e Coxos. Lembro-me de uns dias que começavam com mar minúsculo em São Julião e acabavam com mar grande já nos Coxos.

as melhores coisas do mundo são as coisas simples

Que memórias guardas desses tempos dourados?

Lembro-me desses tempos com muita saudade: não tinha preocupações nem stress. Só tinha um objectivo: pegar na prancha e no saco e passar o dia na praia e entrar para dentro de água três vezes. Chegar a casa já de noite, jantar e pensar nas ondas que ia apanhar no dia seguinte – simples, mas as melhores coisas do mundo são as coisas simples.

o grande salto foram os campeonatos e a competição

Quais foram as maiores mudanças desde que começaste a surfar?

Eu no princípio não sabia NADA (ainda hoje sei pouco), não havia informação nenhuma, pouco ou nenhum acesso a revistas, eu não tinha ninguém ou quase ninguém para falar de bodyboard. A Morey boogie dominava os bodyboards e quase se confundia a marca com o desporto. Eu não sabia coisas tão básicas como pôr ou não fins no bodyboard. No princípio eu estava convencido que sim, que era melhor ter, apesar de falar inglês desde pequenino porque andei numa escola inglesa em Lisboa não sabia o que eram skegs. Consegui ler numa revista que eram fins para bodyboard. Mas aí já tinha comprado uma prancha em San Diego com os maiores skegs que tinha encontrado. Ou seja, asneira. Acabei por ter outras sem fins e percebi que os fins em bodyboards tiravam a velocidade e eram os rails e o corpo do surfista que viravam a prancha. Isto pode parecer muito básico (e na verdade, é) mas eu não sabia e não havia ninguém para falar disto ou de qualquer outra coisa relacionada como desporto. O grande salto foram os campeonatos e a competição. Pela primeira vez eu via pessoas como eu com bodyboards a surfar e a competir. Os primeiros “ el rollos“ que fiz foi depois de ver o Miguel Theriaga, os primeiros 360º pelo Bessone ou pelo Vasco Mensurado. A primeira vez que fui à Costa da Caparica, a Peniche e ao Guincho foi por causa de um campeonato. Afinal havia mais pessoas que faziam bodyboard, além de mim e  do Miguel Barata .

 

Continuas a surfar?

Confesso, com pena, que não vou para dentro de água para fazer bodyboard regularmente, digo mesmo que vou muito pouco. É verdade que tenho um trabalho que me faz estar entre 150 e 200 dias na estrada longe da Ericeira, e quando chego a casa estou de rastos. E quanto menos entras para dentro de água menos queres entrar. É verdade que da minha geração não tenho amigos nenhuns a fazer bodyboard regularmente, a geração do meu irmão é diferente, eles têm um grupo muito fixe e entram muitas vezes. Mas é muita mandriice minha, eu podia ir com eles.

A essência do bodyboard na Ericeira também mudou?

Acho que a essência é a mesma, não mudou muito; e é natural haver mais pessoas dentro de água, mas temos uma costa tão comprida, acho que há ondas para todos.

 

O que mudou após a consagração da Reserva Mundial de Surf, em 2011?

Eu acho que a declaração da Reserva é positiva porque dá uma responsabilidade importante às autoridades para manter e preservar a orla costeira. E a nós, como sociedade, de estarmos vigilantes para comprovar que essa preservação é efectiva. É verdade que traz mais surfers e mais crowd. Lembro-me de muitas vezes entrar no Coxos, São Lourenço ou Limipicos com dois ou três surfers. Hoje já não é assim. Lembro-me em 1982, em Ocean Beach (San Diego, EUA), entrar para dentro de água com 300 surfers e pensar que eram muitos, nunca tinha visto tanta gente dentro de água. Quase 40 anos depois estamos igual. That’s life.