Texto: Hugo Rocha Pereira | Fotografia: Katja Schmidt
Katja Schmidt realizou recentemente uma Tese de Licenciatura que coloca a Reserva Mundial de Surf da Ericeira como objecto de estudo no que toca ao turismo de surf sustentável.
Intitulado “Turismo de Surf Sustentável: Um Estudo de Caso sobre a Ericeira como Reserva Mundial de Surf” (RMSE), este estudo académico recebeu uma nota bastante elevada (1,3, sendo que na Alemanha – onde nasceu e estudou – as notas vão de 1,0 a 4,0, sendo 1,0 a melhor nota possível) na Universidade Hochschule, em Bremen – School of International Business –, onde se dedicou a estudar Gestão Turística.
Katja Schmidt recorreu a várias fontes durante esta investigação, entre os quais artigos jornalísticos, o booklet da RMSE, o site da Save the Waves Coalition e informações disponibilizadas pelo Departamento de Turismo Municipal de Mafra. A estudante realizou ainda entrevistas a stakeholders com especialistas, comparando-as com o Plano de Gestão da RMSE para, no final, formar a sua própria visão sobre este tema tão sensível.
“Durante as minhas viagens por Portugal, sempre analisei conscientemente o turismo nos locais por onde passei. Esse foco específico vem principalmente dos meus estudos, mas também dos meu próprio interesse em como o turismo afecta os lugares de forma positiva e negativa. Além disso, gosto de pensar em quais seriam as boas abordagens para tornar um destino mais sustentável”, começa por dizer, quando questionada sobre a razão que a levou a escolher a Ericeira como tema da sua tese.
“Quando estive na Ericeira pela primeira vez, percebi que tem tudo o que preciso para uma boa vida aqui, segundo as minhas concepções. Como durante o último ano morei sobretudo em Portugal, optando a dada altura por ficar na Ericeira, o assunto foi rapidamente claro para mim e para o meu orientador.”
Katja Schmidt elenca impactos ambientais, económicos e sócio-culturais
De acordo com o que se pode ler na introdução da tese, “o objectivo desta dissertação de licenciatura é analisar o mercado do turismo de surf na Ericeira através de um estudo de caso com uma análise de base científica. Através desta análise, o desenvolvimento e gestão em termos de abordagens sustentáveis serão demonstrados no final para ver se e como a Ericeira enfrenta impactos negativos como destino de turismo de surf.”
Saltando para as conclusões da investigação, Katja Schmidt começa por escrever que “com a atribuição do título de Reserva Mundial de Surf, assistiu-se a um forte crescimento do turismo de surf. Com esse crescimento descontrolado, tem-se observado uma grande pressão sobre o meio ambiente, a economia e aspectos sócio-culturais. Tudo isso impôs a necessidade de exigir uma gestão mais adequada do destino.”
Tendo por base esta divisão em três áreas distintas, os principais impactos detectados são os seguintes:
Impactos ambientais – crescimento exagerado da construção imobiliária, que ocupa áreas naturais, campismo selvagem e problemas com o aumento do número de turistas, que levam ao crescimento da pressão nas infraestruturas, principalmente ao nível do saneamento, bem como o aumento da média de lixo depositado na natureza.
Impactos económicos – aqui existem muitos aspectos positivos, como a criação de empregos e a oferta de empregos na Ericeira, com quebra da sazonalidade. Por outro lado, existem problemas devido ao número não regulamentado de escolas de surf e outros negócios similares. Além disso, também se verifica uma dependência excessiva face ao turismo. O Plano de Gestão da RMSE também aponta aspectos como a falta de legislação e regulamentação ou o desconhecimento dos impactos do surf na economia local e a tipologia de turistas associada ao surf.
Impactos sócio-culturais – o aumento do número de turistas e os frequentes maus comportamentos associados a estes levam a que a comunidade local não se sinta respeitada. Além disso, a gentrificação leva a que a população local se venha progressivamente a mudar do centro da vila para os arredores porque não pode pagar os preços actualmente praticados. Existe também, associado a isto, a perda de identidade local. Muitos destes aspectos são consequência de se terem ultrapassado os limites de capacidade.
A investigadora considera, também, que o Plano de Gestão da RMSE deverá ser melhorado ao nível da respectiva implementação, até porque se tem tornado “visível que a Economia tem tido primazia sobre os valores da Natureza”.
Em jeito de conclusão final, Katja Schmidt escreve o seguinte: “a Ericeira está no bom caminho para ser um modelo para outros destinos de surf, existindo especialmente muito potencial para o futuro. Se a colaboração activa continuar e abordagens sustentáveis forem incorporadas, com revisão e melhoramento dos respectivos processos, o concelho e a Ericeira como destino podem ajudar outros destinos na implementação de práticas sustentáveis. Um destino pode cometer erros na sua gestão face aos desafios enfrentados. Desta forma, é adquirida experiência e os novos conhecimentos podem ser usados para ajudar outros destinos, mostrando-lhes o que não devem fazer ou onde residem os desafios.”
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