Estudo revela como os residentes de regiões costeiras lidam com a subida do nível do mar

Tempestade Hércules Sul. - ph. Nuno Vicente

 

Fotografia: Nuno Vicente

 

A crescente preocupação global em relação às alterações climáticas tem levado a uma série de investigações sobre como diferentes comunidades enfrentam os desafios decorrentes, especialmente em regiões costeiras vulneráveis. Uma pesquisa recente conduzida pelo Centro de Investigação e Intervenção Social (CIS-Iscte) lançou luz sobre a forma como os residentes em zonas costeiras lidam com a ameaça iminente da subida do nível do mar.

Tal como explica Pedro Simão Mendes, em comunicado, com as consequências já palpáveis das alterações climáticas, as zonas costeiras estão sob uma crescente pressão devido à elevação do nível das águas, colocando em risco comunidades inteiras e ecossistemas naturais. No entanto, este fenómeno não é instantâneo, sendo interessante notar que muitas pessoas continuam a escolher viver ao longo da costa. A pesquisa, liderada por Natacha Parreira durante o seu mestrado no Iscte, investigou as estratégias adoptadas pelos residentes do distrito de Aveiro, uma das áreas costeiras mais vulneráveis de Portugal.

a eco-ansiedade pode ser definida como uma preocupação ou angústia persistentes face às ameaças e incertezas actuais e futuras associadas às alterações climáticas

O estudo focou-se na ideia central de “vinculação ao lugar”, definida como a ligação afectiva das pessoas a uma determinada área, bairro, comunidade ou cidade, relacionada com o desejo de permanecer perto devido a um sentimento de segurança e confiança. Duas dimensões dessa vinculação foram exploradas: uma tradicional, associada a um sentimento herdado e à resistência a deixar um local de residência de longa duração, e outra activa, relacionada a um envolvimento mais participativo na comunidade e instituições locais.

De acordo com Natacha Parreira, o estudo, que envolveu 197 habitantes do distrito de Aveiro, revelou que os residentes com uma vinculação activa mais forte à sua localidade tendem a perceber um maior risco de subida do nível do mar e a relatar mais eco-ansiedade. Esses residentes mostraram-se mais propensos a adoptar estratégias activas para lidar com o risco, como procurar informações, tomar medidas preventivas e envolverem-se em iniciativas comunitárias. Por outro lado, não houve um efeito significativo em relação à vinculação tradicional, indicando que aqueles que percebiam menor risco tendiam a adoptar estratégias mais passivas, como a negação, o fatalismo e a resignação.

Hércules. - ph. Manuel Lemos

Hércules. – ph. Manuel Lemos

Segundo esta investigadora, “a eco-ansiedade ou ansiedade climática pode ser definida como uma preocupação ou angústia persistentes face às ameaças e incertezas actuais e futuras associadas com as alterações climáticas”. Este conceito desempenhou um papel crucial na pesquisa. Até mesmo níveis moderados de eco-ansiedade motivaram os residentes a adoptar estratégias activas para enfrentar o risco. Esta acção sugere que a eco-ansiedade pode ser uma emoção moral que impulsiona atitudes proactivas relativamente às incertezas e problemas associados às alterações climáticas.

Os resultados do estudo têm implicações importantes para os decisores políticos e líderes comunitários, especialmente em regiões costeiras vulneráveis. No caso da Ericeira, o município de Mafra deu uma resposta inicial a este problema ao elaborar a Estratégia Municipal de Adaptação às Alterações Climáticas (EMAAC), que simboliza e preconiza o inicio de uma acção concertada e assertiva, a partir de um conjunto de medidas de adaptação que têm como objectivo a minimização da interferência antropogénica no sistema climático e também a sensibilidade e preparação da sociedade para este problema.

Mafra encontra-se a desenvolver o PAC 2030, que inclui uma estratégia para a adaptação e a mitigação das alterações climáticas

Mafra é um dos municípios fundadores da Rede de Municípios para a Adaptação Local às Alterações Climáticas, criada a 9 de dezembro de 2016 e que tem como missão o seguimento do processo contínuo de elaboração de Estratégias Municipais de Adaptação às Alterações Climáticas, aumentando a capacidade dos municípios portugueses e de outras entidades, públicas ou privadas, em incorporar a adaptação às alterações climáticas nas suas políticas de actuação, nos seus instrumentos de planeamento e nas suas intervenções.

O Plano Metropolitano de Adaptação às Alterações Climáticas da Área Metropolitana de Lisboa (PMAAC-AML), apresentado publicamente em Dezembro de 2019, foi um projecto integrado num consórcio, co-financiado pelo Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos (PO SEUR). A sua elaboração decorreu durante 18 meses e envolveu diretamente todos os 18 municípios desta área metropolitana.

De momento, Mafra encontra-se a desenvolver o PAC 2030 de Mafra, que inclui uma estratégia para a adaptação e para a mitigação das alterações climáticas

Ericeira vista aérea – ph. DR

Recentemente, foi implementada uma rede de monitorização climática no concelho de Mafra. Esta rede cobre a totalidade do território, existindo estações meteorológicas nos seguintes locais: Cheleiros, Encarnação, Enxara do Bispo, Ericeira, Mafra, Malveira e Tapada Nacional de Mafra.

Ao considerar os diferentes tipos de vinculação ao local e a sua relação com o risco percebido e as estratégias de resposta adoptadas, os decisores políticos têm a oportunidade de desenvolver políticas mais direccionadas e inclusivas, abordando as necessidades e preocupações de todos os residentes. Este estudo destaca a importância de compreender os factores emocionais e cognitivos que moldam as respostas das comunidades às ameaças das alterações climáticas, proporcionando assim uma base mais sólida para o desenvolvimento de estratégias eficazes e sustentáveis.