A trilhar novos caminhos a partir da Ericeira

Primitive Reason - ph. Paulo Moínhos

 

Texto: Hugo Rocha Pereira | Fotografia: Paulo Muiños

 

Os Primitive Reason estão de parabéns pelos vinte anos de carreira, que começam a comemorar já na próxima quinta-feira, dia 14, com uma actuação no Festival IN, encontro das indústrias criativas na FIL. A propósito deste concerto na capital, conversámos com Abel Beja, guitarrista que integra uma banda que, desde há alguns anos, faz da Ericeira e arredores o seu núcleo familiar e criativo. Estes são alguns dos temas duma entrevista em que também se fala do último disco “Power to the People” e do espírito Primitive, que continua a passar pela mistura e experimentação.

 

Boa parte da banda vive aqui na área há uns anos. Podes falar um pouco dos locais onde moram e da relação que desenvolveram com a Ericeira?

Eu mudei-me para cá em 2004 e o Guillermo de Llera no ano seguinte. O Tino Dias também já está cá há meia dúzia de anos. Todos nós vivemos ‘no campo’, em pequenas aldeias típicas nos arredores da Ericeira. Queríamos estar numa zona onde a qualidade de vida superasse o custo de vida. Sentimos que estamos numa zona privilegiada, onde podemos gozar da tranquilidade do campo e ao mesmo tempo estar perto do mar. A simpatia e simplicidade das pessoas e todo o ambiente à volta da Ericeira são inspiradores e, claro, a gastronomia é do melhor. Sendo músicos, é importante estar num local que nos inspira. Desde então, temos construído aqui a base de trabalho para Primitive Reason. Desde 2005 que ensaiamos por cá, e no ano passado gravamos cá o mais recente álbum nos Estúdios Input, do qual o Tino é proprietário. Vim cá pela primeira vez quando ainda era criança. Estava de férias com os meus pais quando vivia nos EUA. Já lá vão muitos anos desde então e uma dúzia de anos desde que deixei Nova Iorque. Posso dizer sinceramente que é aqui que me sinto em casa. Os nossos filhos já nasceram cá e agora só me faltam mais umas valentes jornadas na prancha para me considerar surfista e ericeirense a sério (risos)!

 

Há coisa de dois anos, o Guillermo dizia-me que a Ericeira era um sítio a entrar em ebulição, com uma energia tipo faroeste, a cena da última fronteira, que é boa para a arte. Mudou muita coisa desde então e continua a sentir-se um clima de mudança?

Muita coisa mudou desde a construção da A21 e a ligação mais direta à A8 e Lisboa. Uma vez que se pode gozar da qualidade de vida que a Ericeira permite e ao mesmo tempo estar a meia hora de tudo que a cidade oferece, há mais gente a mudar para cá. Para pessoas que viviam ou trabalhavam na área da Grande Lisboa, a Ericeira tornou-se uma opção para viver e criar família em vez de ser só aquela zona de praia onde tinham casa de férias ou vinham passar o fim-de-semana. Vêem-se cada vez mais jovens e várias gerações a conviverem juntas na vila. O turismo também cresceu, muito por causa do surf e da bela natureza que temos nesta zona costeira, o que tem trazido cada vez mais pessoas de diferentes países e a influência de outras culturas para cá. Acho que cada vez mais se sente um clima de mudança. A vida nocturna na Ericeira está a crescer. Há mais opções para os jovens em termos de cultura e divertimento. Há cada vez mais gente com ideias inovadoras e ambição para fazer coisas diferentes. Há vários locais que estão a tentar apostar na música ao vivo e na exposição de todo tipo de arte. Há muito mais movimento na vila, e não só durante o verão. Antes, parece que a Ericeira quase fechava para férias a partir de fins de Setembro, o que já não é o caso. Há cada vez mais estrangeiros a viverem na zona. Também conheço cada vez mais gente ligada às artes que se mudou para cá há pouco tempo. Desde músicos a pintores e escritores. O clima de mudança já está instalado e sente-se que vai haver cada vez mais possibilidades.

 

Vamos apresentar um novo alinhamento, que vai ser um género de best of ao vivo.

 

No dia 14 de Novembro vão celebrar 20 anos de carreira no Festival IN, a realizar na FIL. Estão a preparar algo de especial para este concerto?

O concerto na FIL vai ser uma espécie de ‘warm-up party’ para a ‘20th Anniversary Tour’ que vamos fazer em 2014. Vamos apresentar um novo alinhamento, que vai ser um género de best of ao vivo. Além de vários temas do novo álbum, vamos tocar muitos clássicos num alinhamento que vai passar um pouco por toda a discografia da banda. Também vamos trazer de volta algumas surpresas em termos de instrumentos. Na digressão de apresentação do novo álbum, decidimos simplificar e voltar às raízes da banda, com um line up composto só pela base de bateria, baixo, guitarra, sax e voz. Foi muito fixe, mas sentimos a falta dos instrumentos étnicos que tocávamos ao vivo e de algumas sonoridades que tínhamos desenvolvido ao longo dos anos e que agora vamos trazer de volta aos palcos.

 

Lançaram este ano o vosso sexto álbum de originais. Qual tem sido o feedback do público e até onde gostariam de levar as vossas novas músicas nos próximos tempos?

O disco ‘Power To The People’ tem sido muito bem recebido pelo público. Ficámos muito satisfeitos com o resultado final do disco, mas quando tocamos as músicas novas ao vivo e vemos as pessoas a reagirem de uma forma muito positiva, ficamos ainda mais satisfeitos. Além de o álbum ser lançado em formato digital a nível internacional, já temos o CD editado em Portugal, Alemanha, Suíça, Áustria, Holanda, Bélgica e Luxemburgo. Estamos neste momento a negociar a edição noutros mercados europeus, tal como na América. Queremos sempre levar a nossa música o mais longe possível.

 

Vinte anos depois, a natureza de experimentar e de misturar continua a ser a vossa essência?

Sim, acho que só com esse espírito é que Primitive Reason consegue existir. Como disseste, misturar e experimentar coisas novas sempre fez parte da natureza e identidade da banda. Temos mesmo a necessidade de trilhar novos caminhos.

 

Qual é a prenda que mais gostavam de receber neste 20º aniversário?

Acho que a melhor prenda que podíamos receber neste momento é uma casa cheia no dia 14!

Primitive Reason - ph. Ana Limão

ph. Ana Limão