Celebrou-se a Literatura num diálogo com vista para o mar

 

Texto e fotografia: Filipa Teles Carvalho

 

«Tinham gozado muito na Ericeira […] Ludovina tomara banhos; estava forte, mais gorda, e nunca ele a vira com tão boa cara […]».
Eça de Queirós, in Alves & Cª

 

A Sala Atlântico do Parque de Santa Marta, na Ericeira, acolheu Sábado a assinatura de um protocolo entre o Instituto de Cultura Europeia e Atlântica (I.C.E.A.) e o Agrupamento de Escolas da Ericeira – uma parceria que visa dinamizar ligações naturais entre a Escola e a Cultura –, num evento denominado “Literatura em diálogo com…a Ericeira”, simbolicamente realizado no Dia do Patrono da Escola EB 2,3 António Bento Franco.

Com o mar ao fundo, a assinatura do protocolo foi antecedida pela actuação da Filarmónica da Ericeira.

Com o mar ao fundo, a assinatura do protocolo foi antecedida pela actuação da Filarmónica da Ericeira.

António Bento Franco – Um investigador da Ericeira

Anabela Almeida moderou esta conversa e lembraria escritoras “da Ericeira” como Hélia Correia ou Inês Pedrosa. Relembrou e celebrou igualmente o aniversário de António Bento Franco (se estivesse vivo faria neste dia 11 de Fevereiro, 127 anos) e que, dada a vasta intervenção nas mais variadas áreas – da Saúde à Cultura, passando pelo Património Material e Imaterial –, segundo a professora ainda hoje precisa de ser estudado: «Há ainda muito para saber, para aprofundar sobre este “nobre ericeirense”». Um homem com uma dimensão enorme e que deixou uma marca indelével na história da vila.

António Bento Franco foi «um homem bom», disse Pedro Crisóstomo.

António Bento Franco foi «um homem bom», disse Pedro Crisóstomo.

Quem ainda não soubesse ficaria a saber pela voz de Pedro Crisóstomo, professor, músico e autor, que António Bento Franco foi médico, pintor, investigador, compositor, «uma pessoa rara». É também o autor do célebre quadro que retrata Jaime Lobo e Silva. Aguarelista, escreveu Teatro, fez investigação e teve uma intervenção decisiva no património (material e imaterial) da Ericeira. Fundou o Museu da Misericórdia, reactivou a Filarmónica, criou um grupo dramático; e assumiu um papel único em toda a actividade que seria gerada pela Comissão Iniciativa e Turismo. Estudou embarcações e escreveu para a imprensa, local e nacional, e criou ainda a Comissão Pró-Ericeira.

Muito mais foi descrito sobre «o humanista solidário» que escolheu «curar e dar». O médico de província que aos mais carenciados não cobrava a consulta e chegava a facultar os medicamentos gratuitamente.

«Aprendi até morrer. Sempre entendi que as coisas se fazem com o esforço de todos. E o amor pela minha terra fez o resto». Estas foram algumas das mensagens que o “regressado” António Bento Franco, através da actuação de um jovem aluno, veio deixar-nos.

«Aprendi até morrer. Sempre entendi que as coisas se fazem com o esforço de todos. E o amor pela minha terra fez o resto». Estas foram algumas das mensagens que o “regressado” António Bento Franco, através da actuação de um jovem aluno, veio deixar-nos.

A Ericeira na escrita

José Constantino Costa contou algumas histórias sobre António Bento Franco, que descreveram como o médico ia, a meio da noite, a cavalo até ao Pobral se de lá o chamassem; e que o carro que viria (finalmente) a ter foi comprado através de meios financeiros reunidos pela comunidade da Ericeira.

Falaria depois dos escritores da Ericeira e dos que escreveram sobre a Ericeira, ou dos que amaram esta vila. Dos mais jovens e menos conhecidos como Hugo Rocha Pereira («Durante o Fim») e Pedro Crisóstomo («Algodio»), só para citar dois deles, até aos reconhecidos grandes nomes da Literatura Portuguesa, como Eça de Queirós («Alves &C.ª»), António Lobo Antunes («As Naus»), Manuel Pinheiro Chagas («Tristezas à Beira-Mar»), Álvaro Guerra («Razões de Coração») e mais, muitos deles mencionados na obra «Ericeira, Um Lugar Na Literatura», de Sebastião Diniz.

José Constantino Costa lembrou-os, assinalando-se a certeza de que este evento não os abarcaria a todos. No final fica o travo de que há Literatura na Ericeira e Ericeira na Literatura e ainda muitos escritores, antigos e actuais, para celebrar e dar a conhecer. E para dizer o que é a Ericeira para eles, da maneira única que têm as palavras de quem escreve.

À saída, os jovens de guitarra em frente ao mar traziam numa imagem as palavras de Virgílio Ferreira, lembradas no início deste encontro: «Da minha língua vê-se o mar».