Texto: Hugo Rocha Pereira | Fotografia: Hugo Silva, Miguel Nunes MTN e Pedro Mestre
Persistência; foco; disciplina; esforço; sacrifício; garra. Estes são apenas alguns dos atributos que conduziram Tiago Pires à primeira divisão do circuito mundial de surf. E muito talento, claro. Mas ‘Saca’ é, sobretudo, um exemplo perfeito de que o sucesso se atinge com 10% de inspiração e 90% de transpiração. Mais do que um talento puro e inacessível ao comum dos mortais, como Lionel Messi, estará para o surf como Cristiano Ronaldo está para o futebol.
É por isso que este é um campeão como nós. E, como nos identificamos com ele, o Grande Auditório do Centro Cultural de Belém foi pequeno para acolher todos aqueles que gostariam de assistir à ante-estreia mundial de “Saca – O Filme de Tiago Pires”, na Segunda-feira. A Ericeira esteve em peso naquele espaço nobre da capital que elevou o acto de correr ondas a expressão artística. O surf nacional e internacional também se fizeram representar ao mais alto nível, com atletas da elite (de Jeremy Flores a Kanoa Igarashi, passando pelo campeão em título Adriano de Souza, todos eles com fortes ligações ao portuguese tiger), estrelas das ondas grandes, como Garrett McNamara ou Maya Gabeira, e indústria, de empresários a personalidades da World Surf League.
Tiago Pires será, aliás, o único surfista lusitano a conseguir reunir numa mesma ocasião um espectro tão variado e rico de convidados. Não só pelo percurso competitivo (que tem, obviamente, um peso enorme) como também pelas suas características pessoais, que incluem uma sólida ética e uma humildade que caracteriza os grandes. E o documentário que traça a sua biografia encontra na abordagem profundamente humana – com entrevistas que cruzam o rei Kelly Slater com o núcleo familiar e amigos – um dos principais trunfos.
Não se trata duma obra que pretende apenas glorificar, ou mitificar, o melhor surfista português de todos os tempos através dos seus grandes feitos e sucessos. A narrativa vai mais fundo em vários momentos, o que lhe confere espessura e riqueza ao nível dramático. Tomem-se, a título de exemplo, as manifestações de dúvida e insegurança por parte do protagonista a propósito da decisão de terminar a carreira competitiva internacional. Ou os momentos finais do filme, em que ‘Saca’ partilha a raiz da sua alcunha duma forma simultaneamente genuína e simples, emotiva e cómica.
Este sumo e este conteúdo farão certamente de “Saca – O Filme de Tiago Pires” um sucesso para lá da ante-estreia. O filme, realizado pelo brasileiro Júlio Adler e produzido pela GO–S.TV, mereceu ovações de pé no final desta projecção e tem todos os ingredientes certos para encher salas de cinema pelo país fora. A personagem ‘Saca’, tal como João Valente nota a certa passagem da película, encerra uma forte dose de portugalidade. Mas Tiago Pires andou sete temporadas entre a elite do surf mundial, onde nenhum outro compatriota chegou ainda. Que o seu exemplo sirva de incentivo à actual geração e àquelas que vêm aí.