Em tempos como estes, reaprendizagem e reforço são fundamentais!

 

Texto: Ana Catarina Baleia | Fotografia: DR

 

Em tempos como estes, o que podemos nós fazer a não ser parar?

Exactamente isso: parar! E entenda-se “parar” como uma profunda reflexão pessoal, em primeiro lugar. Nós, Portugueses, fomos obrigados a parar, nós jagozes fomos obrigados a parar, nós enquanto humanidade fomos obrigados a parar.

Estamos perante o prolongamento do estado de emergência no nosso país, e com isso aparecem mais questões por parte de todos nós.

A principal questão parte sempre do nosso equilíbrio psicológico, que se estiver assegurado nos permite colocar perguntas e dar respostas coesas, directas e de acção pertinente.

queremos que nos digam em que dia e hora isto irá terminar

Ninguém estava preparado para este cenário. E ao fim de pouco mais de um mês, sensivelmente, após a confirmação do primeiro caso em Portugal, a pressão aumenta cada vez mais. Aumenta a pressão de respostas no Serviço Nacional de Saúde e aumenta a pressão para cada um de nós.

Esta pressão prende-se com o facto de que, estando nós – seres humanos -, privados de qualquer controlo face a esta situação, tendemos a procurar respostas questionando aquilo que não é pertinente questionar.

Temos uma tendência para culpabilizar, julgar e gritar para dentro de um vazio porque aquilo que queremos é que nos digam em que dia e hora isto irá terminar. Tal não é possível. Ao nosso alcance está apenas aquilo que podemos alcançar, e para tal é necessário que façamos uma profunda análise pessoal.

Não podemos (nem devemos) agir por conta própria no que toca a situações que não sejam do nosso domínio. É fundamental que, neste momento, tenhamos a noção que a pandemia que enfrentamos não se resolve com opiniões, resolve-se com acções, sim, mas acções fundamentadas.

Num momento destes devemos olhar de dentro para fora. O ser humano é um ser complexo, detentor de consciência e raciocínio; no entanto, as emoções dominam qualquer razão em tempos como estes, e é exactamente aqui que temos que fazer um exercício profundo sobre as nossas emoções para que estas não nos impeçam de agir em conformidade com a razão.

Sendo menos científica, aquilo a que me refiro é que as moções humanas podem ser impulsionadoras de “perdermos a cabeça”. Sermos traídos por aquilo que de mais precioso temos (a nossa saúde, a nossa consciência e as nossas emoções, que fazem desenvolver os nossos sentimentos) é quase tão ambíguo como a situação que vivemos.

Quando deixamos as emoções toldarem o nosso pensamento clarividente começamos a tocar em feridas que ainda estão tão abertas que é desumano tocar nelas de forma a fazer sangrar ainda mais.

A procura de uma culpa neste momento não nos vai trazer qualquer paz de espírito; pelo contrário, vamos encontrar ainda mais sofrimento, vamos acabar por ter uma reacção de risco, uma reacção que fará de nós pessoas intolerantes e inconsequentes: e neste momento é o mundo inteiro que está a sofrer, não sofro só eu cidadã portuguesa residente na Ericeira.

Toda esta busca desenfreada de nos focarmos no que possa ser mau pode trazer à tona sentimentos de ódio, de repulsa, de exclusão, que ainda poderão ser mais mortíferos que a COVID-19.

Sem querer ser repetitiva, o distanciamento social é aquilo que podemos fazer neste momento. É a única forma que conhecemos de poder travar o mais possível a pandemia até que a comunidade científica descubra como acabar com ela.

nesta fase manter o humanismo é fundamental

Podemos como cidadãos utilizar o que de melhor existe ao nosso alcance, tanto em termos tecnológicos como em termos pessoais. Reeducar o nosso “eu” vai trazer perseverança e resiliência nos tempos que aí vêm – e que nos irão trazer muitas preocupações -, mas se reflectirmos sobre algumas das acções já desenvolvidas não poderemos estar perante uma oportunidade para fazer mais e melhor?

Os Portugueses têm sido exemplo para outros países: exemplo de comportamento, exemplo de acção… claro que nem todos os comportamentos são conscientes, nem todos os comportamentos foram de imediato adequados, claro que tivemos pessoas demasiado “embriagadas” pela emoção a desenvolver comportamentos de risco, deixando-nos perplexos e zangados mas, na sua maioria (com base nos números que nos são apresentados, bastando que pensemos um pouco ao analisar a situação nacional em termos relativos), correspondemos e respondemos de forma adequada, sendo solidários e responsáveis.

Empresários e trabalhadores, no seu geral, não olharam a números económicos e mostraram o altruísmo e consciência olhando para os números de vidas a serem salvas, e só assim poderemos salvar, mais à frente, todos os outros números que fazem parte da nossa sociedade.

Se isto nos está a deixar nervosos? Bastante. E é agora, nesta fase, que manter o humanismo é fundamental. Quando as nossas raízes são fortes, a distância não as abala.

É muito importante partilhar as nossas emoções nesta fase

Por cá, na Ericeira, a nossa comunidade é unida e nos tempos que se avizinham todos devemos manter a união, solidariedade, altruísmo, orgulho, entreajuda e bem receber que nos caracteriza.
O pouco é muito em momentos destes!

É necessário chorar aquilo que for necessário chorar.

É muito importante partilhar as nossas emoções nesta fase, partilhar as nossas agonias, as nossas preocupações; no entanto, temos que estar atentos, resilientes e resistentes às respostas que possamos receber.

Temos que reinventar toda a nossa acção pessoal, toda a nossa acção social. Apenas e só com a nossa saúde poderemos fazer face a um novo ciclo quando tudo isto terminar, ou acalmar.

A coragem nunca foi a ausência do medo, foi sempre precisamente a resposta

A ânsia de que tudo volte ao “normal” é uma boa rampa de questão. O que era o normal não mais será, tornando-se importante que possamos dar voz alta ao que está na nossa garganta sobre as nossas ideias futuras – estas serão as nossas “armas” para enfrentar um futuro que se apresenta tão incerto quanto a certeza que temos de querer fazer parte dele e fazer algo por ele, para partilhar o bom que nos vai poder trazer.

O desespero ao nosso lado pode ser minimizado com o pouco otimismo que possamos partilhar, sendo verdadeiros e realistas. Se evitarmos ser fatalistas perante tanta fatalidade, estaremos a combater aquilo que são os nossos maiores medos.

que possamos manter a esperança no amanhã que nos é dado a oportunidade de reescrever

A coragem nunca foi a ausência do medo, foi sempre precisamente a resposta.

Se nos focarmos nas nossas capacidades psicológicas, limparmos a nossa mente e a isolarmos de respostas motivadas por emoções ambíguas, concentrando-nos na nossa realidade para transformar a mesma em partilha, poderemos ser tão corajosos como fomos na resposta que demos a esta pandemia?

Nós fomos corajosos: nós aqui em Portugal, nós aqui na Ericeira, nós aqui para o mundo e com o mundo.

E assim poderá ser, de dentro para fora, de nós, de todos unidos, que possamos manter a esperança no amanhã que nos é dado a oportunidade de reescrever.