Entrevista: Hugo Rocha Pereira | Fotografias: DR
Quando a Universidade Lusófona promoveu o ciclo de conferências Surf e Performance, Alexandre Grilo, sócio e fundador do Lapoint Camps, foi um dos convidados para debater “A Globalização do Surf”. E a escolha não podia ser mais certeira: a sua empresa pode servir de verdadeiro case study para debater um tema tão actual numa época em que o surf se afirma como fenómeno universal. Nesta entrevista, Alexandre Grilo, conhecido surfista da Ericeira, conta-nos como em pouco mais de dez anos transformou um pequeno projecto num negócio multinacional, com camps (de surf, kitesurf e snowboard) espalhados pelos cinco continentes, de Marrocos à Indonésia, passando pela Austrália e Costa Rica. E embora existam perspectivas de expansão, a Ericeira continua a ser a base da empresa que partilha com outros três sócios.
Em 2001 passava-te pela cabeça que agora tivessem campos espalhados por vários continentes?
Em 2001 só queria era fazer surf e ter um sítio em que eu e os meus amigos pudessem ficar…
Fala-nos um pouco deste vosso percurso.
Comecei o Lapoint Camps em Marrocos em 2001. O objectivo era mesmo ter uma casa em que os meus amigos me pudessem visitar, pois nos anos anteriores eu organizava surf trips de carro e já estava um pouco cansado de fazer a viagem entre Lisboa e Agadir no meu Peugeot 505… O projecto começou com o apoio de alguns amigos, como o “Saca”, que levavam lá várias revistas e amigos surfistas como o Adriano de Souza. Sempre foi um negócio pequeno que dava para os custos e às vezes nem isso (risos). Em 2006 conheci um sueco (Sebastian Kjelstrom) que me propôs um parceria, em que o trabalho dele seria encher o camp, mas com a condição de eu montar mais um em Portugal… Na altura, nem liguei, pois sempre tive pessoas a dizer isso e quando chegava a altura nada aparecia. No Inverno de 2006 o Sebastian ligou-me e disse que já tinha patrocínios para o camp, uma carrinha e vários clientes reservados. Aí eu comecei a trabalhar com ele e a tratar de todas as partes legais para podermos começar o surf camp em Portugal. Foi um Verão óptimo e divertimo-nos bastante. Neste momento temos vários surf camps no mundo e somos quatro sócios: Peter, Goran, Sebastian e eu.
Em 2001 só queria era fazer surf e ter um sítio em que eu e os meus amigos pudessem ficar
Na tua perspectiva, quais foram os passos fundamentais para chegarem onde estão actualmente?
Penso que a razão do sucesso do Lapoint sempre foram as parcerias que fizemos com pessoas profissionais e a maneira como operamos cada país a tentar sempre envolver restaurantes locais, surf schools locais, bares, discotecas e trabalhadores que falem as línguas… Penso que o mais importante é perceber o que os clientes precisam e tentar sempre dar-lhes as melhores férias possíveis… O que para uns é mais um dia, para outros são as férias com que eles sonharam e trabalharam durante um ano.
E que dicas ou conselhos podes deixar para alguém que pense que basta juntar água salgada aos surf camps ou hostels para ter sucesso?
Aconselho as pessoas a criarem negócios virados para os turistas e não a tentarem copiar o vizinho do lado com um preço melhor. Sejam inovadores e vençam por mérito. Existem bons exemplos de pessoas que acreditaram e hoje em dia têm um bom negócio na Ericeira: o Tubo, bar inovador em festas populares; o La Luna, que é sempre uma noite divertida; Mica Surf Boards, mais virada para pranchas à medida e com a preocupação em acompanhar os clientes na evolução. O Activity Surf Center também é outro bom exemplo em que o Lapoint e o “Papu” fizeram uma parceria para tentar criar actividades para os turistas, como passeios de barco ou pesca, aulas de surf privadas, actividades e festas para crianças, etc.
Qual é a vossa perspectiva para o futuro?
Actualmente temos surf camps na Ericeira, em Bali, na Austrália, Sri Lanka, Noruega, Costa Rica, Alentejo; depois temos kite surf no Egipto, na Noruega, em Itália e Esposende. Temos ainda três snow camps. E novos países virão. Neste momento estamo-nos a focar mais no surf, no kite e no fitness. A nossa perspectiva passa sempre por abrir mais camps onde vemos essa necessidade, mas mais que tudo é reestruturar os camps que temos e aumentar a qualidade de todos.
Onde é que se pode aprender mais sobre a vertente empresarial do surf: na faculdade ou na praia, seja dentro ou fora de água?
Sou um mau exemplo pois nunca fui à universidade e sempre tive cabeça para o negócio. Penso que a experiência é o mais importante, mas faz sempre falta alguém com estudos para as outras áreas igualmente importantes, como economia, marketing e design.
Neste momento estamo-nos a focar mais no surf, no kite e no fitness.
Ter sido campeão nacional norueguês tem algum significado para ti?
Como surfista profissional, na altura era sempre bom mais um título, tal como campeão de Marrocos, campeão do circuito do Ericeira Surf Clube ou de Carcavelos. Acho que é sempre bom para a motivação ganhar uns campeonatos. Ter sido campeão norueguês foi bom, a meu ver, pois todos os meus clientes são escandinavos e não conhecem ninguém em Portugal. Assim, indo lá fazer campeonatos e mostrar que podem vir aprender a fazer surf com boas condições é sempre uma mais-valia. Agora já tenho um team que faz isso por mim… já estou pesado e falta-me tempo para o surf.
Numa época de globalização no surf, continua a ser possível preservarem-se diferenças substanciais nas diversas surf cultures existentes de região para região?
Penso que é isso que faz a Ericeira tão importante. Por isso tentamos mostrar o que a Ericeira tem de bom e não e só encher chouriço que o inverno e longo. Vejo outros sítios do país que fazem isso e mais cedo ou mais tarde vão ter que mudar.
O que representa a Ericeira para ti e para o Lapoint?
A Ericeira neste momento é a minha casa, o sítio onde ganhei vários anos o campeonato do clube e a maior base da empresa Lapoint… e queremos sempre crescer mais aqui na Ericeira para que a qualidade aumente e as atracções para os turistas também aumentem.