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Situa-se no centro histórico da Ericeira um dos edifícios mais antigos e emblemáticos da região. A sua característica fachada serve hoje de entrada para a Casa de Cultura Jaime Lobo e Silva, onde se realizam periódicas exposições de arte, assim como várias outras actividades de divulgação cultural.
Mas a história da Casa de Cultura, que ainda hoje é conhecida por alguns dos locais como “o casino”, remonta ao longínquo ano de 1861. Foi lá que, em meados do século XIX, se fundou o Clube Recreativo Ericeirense.
A fundação e o fundador
A história do Clube Recreativo Ericeirense não pode ser separada da história pessoal de Francisco Silva Ericeira, um dos mais emblemáticos habitantes da região. Foi Silva Ericeira quem fundou o clube, que se destinava a organizar saraus musicais e que só estava aberto durante a época balnear.
Um Jagoz ferrenho e determinado, Silva Ericeira foi um homem de muitos talentos, cuja biografia se pode confundir com o passado da própria vila. Tal como a Ericeira vive voltada para o mar infinito, também Francisco Silva viveu com um pé na terra e outro na água. Nasceu em 1800, no ano de viragem do século, e dedicou grande parte da sua vida à profissão de oficial da Marinha Mercante. Nunca perdeu a ligação com o oceano, mas dedicou-se mais tarde aos ofícios da terra.
Eu desta vida só fico contente que a minha terra amei e a minha gente
Nomeadamente, à gestão de várias propriedades que possuía na região da Ericeira. Um homem abastado, inteligente e resoluto, Silva Ericeira fez tudo o que pôde para ajudar a expandir cultural e economicamente a sua terra natal. Foi administrador do Concelho e desempenhou também a função de Presidente da Câmara. Além disso, colaborou com a paróquia local e ajudou a fundar e a difundir o Clube Recreativo Ericeirense.
Ainda hoje tido como uma das mais notáveis personalidades da Ericeira, Francisco Silva morreu no ano de 1871. No seu testamento deixou instruções para que fosse cinzelado na sua lápide o seguinte epitáfio: “Eu desta vida só fico contente que a minha terra amei e a minha gente”.
O Grande Casino
Menos de meio século após a morte de Francisco Silva Ericeira, o Clube Recreativo Ericeirense passou pela sua primeira grande transformação. Numa altura em que a vila se transformava num cada vez mais popular destino turístico, o empresário Joaquim Ferreira decidiu transformar o emblemático edifício do século XIX num casino. Foi assim que surgiu a primeira e única grande casa de jogo da história da Ericeira, de forma muito elementar designada como “Grande Casino”.
O Grande Casino da Ericeira continuou a funcionar como um espaço de cultura, onde se organizavam grandes matinés e onde actuavam grupos de música e de dança. Mas a grande novidade introduzida pelo empresário Joaquim Ferreira foram as mesas de jogo. Desde a roleta até à banca, existiam jogos de sorte e azar à altura de qualquer apetite, ainda que o casino fosse considerado modesto segundo os padrões actuais.
Em 1924, o Grande Casino foi remodelado e atraiu durante vários anos muitos visitantes vindos de Espanha, que eram seduzidos pelo conforto das suas instalações, pelos almoços-concerto organizados no restaurante do casino e pelo inesgotável charme natural do Verão da Ericeira.
Foi no Casino que os ericeirenses tiveram pela primeira vez acesso a um cinema
Ao longo de quase todo o Século XX, o Grande Casino foi seguindo as tendências da época, adaptando-se às novas tecnologias e servindo como o grande centro cultural da Ericeira, função que o edifício continua a desempenhar nos dias de hoje. Durante as décadas de 30 e 40 era no Grande Casino que os habitantes da Ericeira tinham acesso à rádio pública. O sempre-presente rádio inspirou os locais a cunhar a expressão “o sonoro do Casino”, e o edifício foi para muitos locais a única maneira de ter acesso a um rádio.
Durante a década de 60 o Grande Casino continuou a funcionar segundo os trâmites da época, promovendo a realização de peças de teatro inspiradas no sucesso do tradicional teatro de revista de Lisboa. Foi também no Grande Casino que os ericeirenses tiveram pela primeira vez acesso a um cinema, que estava ao alcance de jovens e trabalhadores de todas as classes sociais.
O centro cultural da Ericeira
Depois de ter encerrado no final da década de setenta do Século XX o Grande Casino foi adquirido pela Câmara Municipal de Mafra, que decidiu renovar o edifício. A histórica fachada passou desde então a albergar a Casa de Cultura Jaime Lobo e Silva.
Ainda que sem roleta nem mesas de jogo, a Casa de Cultura continua a servir o mesmo propósito que o casino sempre teve: o de ser o núcleo cultural da região. Actualmente, conta com uma biblioteca de acesso público com mais de 17.000 livros.
Além disso, realizam-se na Casa da Cultura inúmeros eventos culturais. Embora pouco luxuoso, o edifício encontra-se ainda equipado com um pequeno anfiteatro, uma sala de leitura, um espaço infantil, um espaço áudio-visual e uma sala de multimédia com acesso público à Internet.