Texto: Hugo Rocha Pereira | Fotografia: DR
Um dos mais aclamados e internacionais músicos portugueses da actualidade, Rodrigo Leão vai este fim-de-semana apresentar nos Coliseus de Lisboa e Porto o espectáculo “Bandas Sonoras”, onde vai transpor para o palco boa parte dos trabalhos que fez para cinema ao longo deste último ano. A AZUL aproveitou a oportunidade para conversar com o compositor sobre três das suas grandes paixões: a música, a sétima arte e a Ericeira, à qual está ligado desde a infância e que bastante tem inspirado a sua arte.
Quando começaste a vir para a Ericeira?
Comecei a ir para a Ericeira com uns seis, sete anos. O meu avô tinha uma casa na Rua de Baixo, ao lado dos antigos Bombeiros, mesmo em cima do mar. A Ericeira, para mim, é um sítio muito especial. É uma terra mágica. Todos os Verões aí passados, os amigos que aí fiz e os grandes momentos aí passados. Para não falar do peixe e do mar, claro, que talvez seja o mais importante na Ericeira.
A Ericeira tem sido inspiradora para a tua música?
Compus muitas músicas aí. Compus as primeiras músicas da Sétima Legião nessa casa do meu avô. Estou-me a lembrar, por exemplo, d’“A Partida”, que está no single “Glória”, de 1983 – há 30 anos, portanto. E, mais tarde, era um dos sítios preferidos para me retirar de modo a ficar mais calmamente a compor e a trabalhar nas minhas músicas. Estou-me a lembrar, por exemplo do “Theatrum”, álbum de 96, que foi todo composto na Ericeira num Inverno, entre Outubro e Dezembro. Tive a oportunidade de viver aí durante esse período, vindo a Lisboa só de vez em quando.
O tema “Praia do Norte”, do disco “A Montanha Mágica”, é inspirado pelos momentos que passaste no Algodio…
Tenho ali recordações de infância, de ir à praia com os meus irmãos e os meus pais. Era uma praia que ficava muito perto da nossa casa, bastava descer a rua e estávamos lá. E mesmo na adolescência continuou a ser uma das minhas praias preferidas. E tinha a sorte de poder lá ir não só no Verão como noutras alturas: na Páscoa e até no Inverno.
Continuas a vir à Ericeira regularmente?
Tive a oportunidade de passar este último fim-de-semana aí com a minha família e soube-me muito bem. Acho que a Ericeira está muito mais limpa e cuidada. Continua a ser um grande sítio. Tem qualquer coisa de muito estimulante e os sítios são importantes quando estamos a tentar criar algo. E a Ericeira é muito inspiradora para se trabalhar. Infelizmente, agora vou muito menos à Ericeira do que gostaria porque agora temos uma casa perto de Avis, no Alentejo. De há uns anos para cá vou mais para lá do que para a Ericeira. Mas, ainda assim, acabo por ir aí todos os anos, pelo menos duas, três vezes.
Sabias que no booklet da Reserva Mundial de Surf surge parte da letra do “Sete Mares” (“se os mares são só sete / há mais terra do que mar”) da Sétima Legião, a propósito desta Reserva ser constituída por sete ondas?
Tinha conhecimento desse título atribuído à Ericeira, mas não tinha conhecimento desse booklet nem de que a letra do “Sete Mares” surgia aí. Essa coincidência é engraçada. Nunca fiz surf na vida (risos), mas sei que a Ericeira é também um sítio muito especial para os surfistas.
A Ericeira é muito inspiradora
Passando para os concertos dos Coliseus, o que podem as pessoas esperar dum espectáculo intitulado “Bandas Sonoras”?
Estes concertos vão ser, precisamente, o palco para muitas das músicas que fiz ao longo deste último ano, em que compus bastante para cinema. Essas músicas vão ter arranjos diferentes e vão ser interpretadas por uma formação alargada: vamos ter mais um quarteto de cordas e um trio de sopros a juntarem-se ao grupo habitual. A primeira parte dos concertos vai ser dedicada a estes temas instrumentais. Penso que a minha música sempre transmitiu esse lado cinematográfico.
De onde vem esta paixão pelo cinema e quais são as tuas principais referências na sétima arte?
A paixão pelo cinema vem de muito cedo. Lembro-me de com 12 ou 14 anos ir muito ao cinema Quarteto, em Lisboa. Passávamos lá a vida, às sextas-feiras havia sessões de dois, três filmes da meia-noite às seis da manhã. E os meus pais também estimularam muito essa paixão. Na minha adolescência admirava muito realizadores como Visconti ou Truffaut. Só mais tarde, em 87 ou 88 surgiu a oportunidade de, pela primeira vez, compor música para um filme: “Um Passo, Outro Passo e Depois”, do Manuel Mouzos. E foi aí que comecei a ganhar uma maior paixão pela composição para cinema. Infelizmente, durante muito tempo não houve grandes convites para isso, até porque a indústria do cinema em Portugal é muito pequena. Depois disso houve o “Cinema” (disco de 2004) e o Cinema Ensemble (formação) e este ano, inesperadamente, fui convidado para fazer música para quatro filmes: “O Mordomo”, de Lee Daniels; “A Gaiola Dourada”, do Ruben Alves; “Ginga, Rainha de Angola”, do Sérgio Graciano; e “O Frágil Som do Meu Motor”, do Leonardo António.
Gostarias de ter outro tipo de experiência no cinema, além de compor bandas-sonoras?
(risos) Não, penso que não. Como actor, penso que não teria muito jeito, nem interesse. É a música que me liga mais ao cinema, de facto.