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Um artigo de opinião recentemente publicado no website do Diário de notícias destaca a brasileira Nova Ericeira, fundada por colonos Jagozes no Século XIX, realçando o papel desempenhado pela editora local Mar de Letras na divulgação da História e Cultura da vila “onde o mar é mais azul”.
Este artigo, escrito pelo Historiador António Araújo, começa por elogiar as “pequenas editoras, geralmente de província, que nos trazem obras preciosas, interessantíssimas”, entre as quais a Mar de Letras, que “tem realizado, ao longo de anos, uma acção exemplar na promoção da história e da cultura da Ericeira, com colecções como Traços da História, Arte e Património, Crónicas e Ficções ou Lugares de Memória.”
o que ali ficamos a saber do que foi a história da vila piscatória, as coisas que lá houveram, gente que ali nasceu ou viveu, dá-nos bem a ideia da riqueza tão diversa do nosso passado comum
Intitulado “A Nova Ericeira (ou um problema chamado Brasil”), o texto debruça-se precisamente sobre uma breve monografia publicada pela Mar de Letras no ano 2000: “A Ericeira Brasileira – Trajectória de uma colónia portuguesa no litoral sul-brasileiro”, da autoria de Arlete Assumpção Monteiro, Doutora em História pela Universidade de São Paulo.
Essa obra relata a história de uma comunidade criada e forjada por El Rei D. João VI, dois anos após ter proclamado, em 1815, o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves.
No dia 18 de Outubro desse ano, D. João VI ordenara que fosse medida e demarcada uma légua de terra na Enseada das Garoupas – região longínqua do Brasil meridional, hoje Estado de Santa Catarina -, com vista a que aí se fixassem colonos vindos de Portugal por se tratar de um local considerado estratégico para a defesa da capitania lusitana.
E foi assim que, por aviso régio de 25 de Março de 1818, o Intendente da Marinha de Santa Catarina, comandante Miguel de Souza e Alvim, foi encarregado da fundação de um povoado para os colonos vindos da Ericeira na Enseada das Garoupas.
Um mês e pouco depois, no início de Maio desse mesmo ano, aportava ao Rio de Janeiro a galera Conde de Peniche, que levava a bordo 101 pessoas de ambos os sexos, depois transportadas para o litoral sul, O grupo era composto por pescadores, entre diversos outros profissionais, aos quais caberia construir as próprias casas.
Esta colónia, baptizada de Nova Ericeira, ficava situada num “local remoto e distante, com um Atlântico de permeio, uma terra de difícil acesso e falha de comunicações, cercada de índios bravios e hostis, apenas com o mar defronte”, mas aqueles Jagozes levaram a sua missão avante com sucesso e uma certa dose de heroísmo, trabalhando, casando, criando filhos e vivendo até ao final dos seus dias.
os pescadores portugueses mantiveram-se unidos, juntos e na paz possível, e os 1500 indivíduos e as 354 habitações de 1824 cresceram, em 1832, para 492 casas e 2164 pessoas livres
Seis anos depois da sua fundação, a colónia de Nova Ericeira contava com 1536 habitantes, muito embora nem sempre – ou melhor, quase nunca, como repara o Historiador – os poderes públicos tenham cumprido as suas promessas de fornecimento de sementes, gado, alfaias agrícolas ou remuneração aos ericeirenses.
A elevação à categoria de vila chegaria no dia 13 de Outubro de 1832, atestando o êxito desta empresa povoadora.
Seis anos mais tarde, o historiador brasileiro Henrique Boiteux assinalava que Nova Ericeira triunfara, contra tudo e contra todos, devido à fibra das suas gentes: “abandonados os colonos a si, em terras impróprias à cultura, tanto mais sendo pescadores de profissão, o tamanho das terras lhes era totalmente alheio, mas apesar de tudo foram progredindo.”
Nova Ericeira, entretanto rebaptizada como Porto Belo, é actualmente um destino turístico de eleição, conhecido como “paraíso das 32 praias”. Boa parte dos actuais habitantes são pescadores e descendentes de portugueses, utilizando termos que, segundo a investigadora Arlete Assumpção Monteiro, não são comuns no resto do Brasil, havendo mesmo expressões coloquiais muito usadas também na Ericeira, bem como uma sonoridade comum em certas palavras ou frases.
António Araújo considera que devemos “respeitar o seu esforço hercúleo e, sobretudo, o seu profundo sentido de comunidade, o espírito de união que os manteve ali, contra todas as adversidades e probabilidades, durante mais de dois séculos.”
É possível ler aqui este artigo na íntegra.