Homem Ingere Cimento e Morre Lentamente

 

Texto: Felipe de Ramos | Fotografia: Marco Oliveira

 

Este texto não é nem “news”, nem “fake news”. É a verdade de um alguém que por aí anda. Um alguém que tem nome mas que não o diz. Talvez porque tenha ingerido demasiado cimento.

Precisamos falar mais sobre as feridas que não sangram e sobre as doenças ovelhas-negras. Felizmente, esta nova geração está para aí virada: podemos todos, em todo o lado, afirmar que nunca antes as depressões e as ansiedades estiveram tão expostas como nos dias de hoje.

Ainda bem!

E não. Não é porque somos mais fracos que as gerações passadas e nem porque estamos mais propensos a contrair o frio intelectual e a apatia emocional por andarmos pouco agasalhados. Estes dias, numa das cativantes partilhas dos meus cativantes amigos no Facebook, vi uma publicação de uma daquelas páginas melancólicas de auto-ajuda que dizia: “Esta geração só precisa frequentar os psicólogos porque a outra geração não o fez.”

Ora, não deixa de ser verdade.

Esta geração só precisa frequentar os psicólogos porque a outra geração não o fez

Eu cresci numa família de gente muito prática e despachada que acreditava que todo e qualquer problema não corpóreo existia por “perturbações espirituais” ou “frescura”. Bem, verdade seja dita: sempre fui um bocadinho lamechas e espiritualmente perturbado – mas só porque sou o irmão mais novo e porque nunca atinei com nenhum conto religioso (o que não significa que não seja espiritual, mas isso já será matéria para outro texto).

Não se trata de nós, da geração Y, culparmos a geração X. Até porque, eventualmente, a geração Z poderá fazer o mesmo no futuro e nunca mais saímos desse ciclo de culpa. Trata-se, sim, de algo muito simples: continuarmos a fazer o que estamos a fazer – mostrarmo-nos vulneráveis.

É fácil? Não é fácil, não senhor. Brené Brown, a maior especialista contemporânea nos estudos de vulnerabilidade, que o diga.

Ainda assim, é preciso percebemos que sozinhos não vamos nem a Roma nem ao Festival do Pão. Porque não vale a pena.

Não vale a pena ocultarmos as nossas lutas interiores, sejam elas com monstros, javalis, vespas asiáticas ou porquinhos da índia. Não vale a pena não confessarmos que, por vezes, nem o sentimento de vazio sentimos. Não vale a pena prolongarmos as palpitações e os suores faciais que duram longos milissegundos.

Não vale a pena morrermos lentamente sem pedir socorro.